Publicado em 14/08/2018 - geral - Da Redação
É
inegável a importância da política para a humanidade. E refiro-me não somente à
política institucional e partidária, mas à política enquanto capacidade genuína
que o ser humano desenvolveu de resolver os inevitáveis conflitos do cotidiano
sem o uso da violência. Como bem definido por Mao Tsé-Tung (1893-1976), líder
revolucionário e ditador chinês, “a política é a guerra sem derramamento de
sangue, e a guerra uma política com derramamento de sangue”.
O fato, porém, é que, como toda criação humana, a política
também sofre o duro golpe da realidade em relação àquilo que imaginamos que ela
deveria ser e a forma pela qual a experimentamos na vida real. Basicamente, a
percepção dessa diferença foi responsável pela superação do pensamento político
clássico e o aparecimento do pensamento político moderno, no qual o pai
fundador é o filósofo florentino Nicolau Maquiavel (1469-1527).
Até então, a política clássica era focada em questões
relacionadas à “felicidade” e à “vida boa”. Seus principais expoentes são:
Platão (427 a.C.-347 a.C.) e Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.). Para Platão, a
cidade deveria ser governada pelos reis-filósofos (cidadãos que através de uma
educação especial superariam o egoísmo, a maldade e erros de um ser humano
comum e, em razão disso, seriam capazes de conduzir a cidade à felicidade). Por
sua vez, Aristóteles via a política como ferramenta necessária ao
desenvolvimento de bons cidadãos e a consequente boa condução da cidade.
O grande problema, leitor e leitora, é que a política é uma
atividade essencialmente humana, e sendo assim, ela obedece e está sujeita à
nossa natureza: interesseira, ardilosa, ingrata, imprevisível e etc.. Diante
desse caos, Maquiavel preocupou-se em retirar a política do plano ideal e
trazê-la ao plano real, a encarando como uma atividade de humanos que buscam e
brigam por poder. O foco, a partir de então, seria a governabilidade,
transferindo a busca pela felicidade e bem comum para outro terreno, como a
igreja, por exemplo.
O realismo político de Maquiavel, portanto, nos diz uma
coisa: política é um jogo de interesses, que nem sempre, ou quase nunca, o bem
comum é o principal objetivo. Isso, também, por uma razão bem prática: a “vida
boa” é um critério extremamente subjetivo, ou seja, não há uma única maneira de
concebê-la; isso vai depender de onde você é, o que você faz, o quanto você tem
e em quê você acredita. Empurrar uma concepção particular de “bem” goela abaixo
de grupos e sociedades tão diversas não me parece o melhor caminho a seguir.
Eu sei, encarar a política por esse ângulo não é uma tarefa
fácil. Mas extremamente necessária. A primeira consequência dessa visão é não
mais se deixar enganar por discursos que prometam mundos e fundos em nome de
algum “bem maior” ou que embasam-se no argumento de levar a sociedade ao mundo
da “felicidade”. A segunda consequência é a percepção de que, se você não
reconhecer seus próprios interesses (independente de quais forem), suas
demandas e procurar saber qual partido ou associação da sociedade civil os
representam, você estará fadado ou fadada a continuar sentindo-se excluído e
excluída da política.
Quando deixo de lado o juízo de valor a respeito dos
interesses, não estou de maneira alguma relativizando-os. Falo sempre com um
pano de fundo fundamental a qualquer discussão sobre política: a democracia.
Dessa forma, jamais apoiaria algo que solapasse os direitos individuais e
coletivos conquistados às duras penas. O que friso com a afirmação é o
seguinte: você, leitor e leitora, certamente tem interesses e visões de mundo
diferentes das minhas e de milhares de outras pessoas. Desde que, seus
interesses não sejam o extermínio em massa, escravidão, ou quaisquer outras
coisas que firam a busca pela felicidade de outra pessoa, você não só tem o
direito de tê-los, mas deve defendê-los.
Nesse aspecto, a democracia (enquanto procedimento, isto é:
eleições) é de suma importância, pois é um mecanismo muito interessante na
mediação e canalização dos mais diversos interesses. É exatamente sobre isso
que discutiremos nas próximas semanas.
Thálles
Dias