Publicado em 27/09/2019 - cesar-vanucci - Da Redação
Razões
mais do que convincentes. Ousamos mesmo afirmar: irrespondíveis. À luz do bom
senso, do sagrado interesse público, das respeitáveis conveniências políticas,
sociais e econômicas, a pretendida privatização da Cemig é simplesmente
inaceitável.
A
entrevista que o engenheiro Aloísio Vasconcelos, ex- diretor da estatal de
energia e ex-presidente das Centrais Elétricas Brasileiras (Eletrobras),
concedeu, a propósito da flamejante questão, ao “Diário do Comércio”, edição de
18 de setembro passado, fundamenta impecavelmente o estridente equivoco em que
o governo de Minas Gerais labora, com estimulante apoio de alguns setores da
administração federal, ao colocar em andamento conjunto de ações com o fito de transferir
para grupos privados um bem público valiosíssimo, de extraordinária importância
estratégica para o Estado e para o País.
Quem
se der ao trabalho de ler, com a devida atenção, os lúcidos argumentos
alinhados no citado depoimento, chegará, inapelavelmente, de forma serena e
objetiva, à intransponível conclusão de que a anunciada desestatização constitui,
em termos definitivos e de forma irreplicável, um baita de um péssimo negócio.
Se chegar a ser efetivado, por algum imperdoável descuido administrativo ou
parlamentar, redundará numa operação desastrada. Mais uma, por sinal, na encorpada
lista das privatizações desnecessárias. Privatizações impostas, como sabido, ao
todo da sociedade, por força de insensibilidade política associada à ambição desmesurada
de minoritários grupos de mercadores oportunistas.
Depois
de indagar se o governo, “que é passageiro e acaba daqui a 3 anos”, tem o
direito de passar para terceiros um patrimônio dessa magnitude, “que é de longo
alcance e já tem quase 70 anos”, Vasconcelos explica que, em apenas 2 anos,
Minas Gerais terá condições de receber em dividendos, como fruto das operações
da Cemig, todo o dinheiro equivalente ao valor a ser supostamente apurado nessa
transação que a opinião pública mineira maciçamente repudia. Nas considerações
críticas levantadas pelo engenheiro, reconhecido especialista na temática
energética, é anotada também a circunstância de que as empresas privadas de
eletrificação se recusam, invariavelmente, a participar de projetos sociais do gênero
“Luz para todos”, por não serem lucrativos. Com tal postura, impedem sejam
levados às zonas campestres os tão almejados benefícios da chamada
“eletrificação rural”. Outra contraindicação à privatização da Cemig, uma
empresa de alta eficiência e esplendida lucratividade, está configurada,
segundo Aloísio Vasconcelos, na constatação de que “as empresas privadas ou que
foram privatizadas, todas elas, sem uma única exceção, aumentaram o custo da
energia após a privatização”. E, ainda, o que é muito preocupante para a
população mineira, “... tiveram uma piora nos índices que medem a qualidade da
energia”. Em Goiás, num caso recente de privatização, a população sai às ruas,
todos os dias, brigando e protestando. A privatização, no episódio relativo ao
vizinho Estado, favoreceu uma empresa italiana. O entrevistado garante: “O povo
de Minas Gerais, que aprova a Cemig por 84% e 16%, vai passar a ter sua energia
fornecida por uma empresa privada, que vai piorar a qualidade do serviço e
cobrar mais caro por isso. Isso é inaceitável. A Cemig tem hoje 8,5 milhões de
consumidores. Claro que não vão ser ouvidos”.
O
ex-diretor da Cemig e ex-presidente da Eletrobras é ainda de opinião que a
chance de vender a Cemig é mínima. Primeiro, devido ao fato da esmagadora rejeição
popular à despropositada ideia. Segundo, pela contingência de que a Constituição
estadual exige seja a transferência aprovada em dupla votação na Assembleia
Legislativa, com quorum qualificado (50 deputados a favor). E, ainda assim,
caso o Parlamento ceda a pressões do governo, aprovando a privatização, a
decisão final só poderá ser adotada depois de um referendo popular.
Sabedores
de que a tese da privatização não encontra eco no seio da comunidade mineira,
as forças empenhadas em levar a cabo, a qualquer preço, a empreitada
desestatizante, concentram todo esforço na tentativa, agora, de persuadir os
integrantes da Assembléia Legislativa a alterarem o dispositivo constitucional
que remete a decisão a escrutínio público. Vasconcelos prognostica que, se esse
absurdo prevalecer, a Cemig acabará sendo adquirida, provavelmente, por uma
estatal estrangeira, da China, da Itália ou da França. Sem dúvida alguma, um
contrassenso risível que poderemos ser compelidos a engolir como consequência
de deliberações políticas inteiramente despojadas de sentimento nacional.
Por
derradeiro, convidamos o leitor a por tento em mais este outro argumento levantado
na entrevista comentada. A privatização da Cemig é desaconselhável por causa do
controle sobre os rios. “Para se ter uma idéia da importância do domínio dos rios,
nos Estados Unidos, as usinas que têm domínio do rio, como as do Tennessee, Chattanooga,
são administradas pelo Exército americano. Não é nem pela engenharia privada ou
estatal. São controladas militarmente por causa do domínio do rio”, esclarece
Vasconcelos.
Encurtando
razões: diante de tudo quanto aqui exposto, só mesmo o excesso de má vontade, de
desconhecimento de causa e de arrogância poderá tentar encontrar “sentido” na
tese da privatização de uma empresa com as características da Cemig. Fim de
papo.
Cesar Vanucci - Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)