Publicado em 06/11/2020 - cesar-vanucci - Da Redação
“A capadura deverá ser a macete." (Decisão judicial de 1833)
No documento abaixo transcrito,
que desencavei do fundo do baú, conta-se como o cabra da peste Manoel Duda, por
causa de malefícios praticados contra a mulher de Xico Bento, foi condenado à
capação a macete, nos idos de 1833, na comarca de Porto de Folha. Já na súmula
da decisão, é sublinhado que “comete pecado mortal o indivíduo que (...) faz
coças de suas victimas desejando a mulher do próximo para (...) suas
chumbregâncias”.
A decisão do Juiz Municipal, acolhendo representação da Promotoria, é abaixo reproduzida, respeitada a ortografia original, inclusive com a expressão xumbregância grafada com “ch”.
“VISTOS, ETC.
O
adjunto de Promotor Público, representa contra o cabra Manoel Duda, porque no
dia 11 do mês de Nossa Senhora Sant’anna, quando a mulher do Xico Bento ia para
fonte, o supracito cabra que estava de tocaia em uma moita de mato sahiu della
de supetão e fez proposta a dita mulher (...), para coisa que não se pode
trazer a lume, e como ella se recusasse, o dito cabra abrafolou-se ella, (...) deixando
as encomendas della de fora e ao Deus dará, e não conseguio matrimonio porque
ella gritou e veio em assucare della Nocreto Correia e Clementos Barbosa, que
prenderam o cujo em flagrante, e pediu a condenação delle como incruso nas
penas de tentativas de matrimonio proibido
(...). As testemunhas, duas são de vista porque chegaram no flagrante e
bisparam a perversidade do cabra (...). Dizem as leises que duas testemunhas
que assistam a qualquer nauvrágio do sucesso faz prova (...):
CONSIDERO – que o cabra Manoel
Duda, agrediu a mulher do Xico Bento por quem roia a brocha, para conxambrar,
com ella, coisas que só o marido della, competia eonxambrar, porque eram
casados pelo regime da Santa Igreja Catholica Romana; - que o cabra deitou a
paciente no chão e quando ia começar as suas conxambranças, viu todas as
encomendas della que só o marido tinha o direito de ver; - que a paciente
estava peijada e que em conseqüência do sucedido, deu à luz de um menino macho
que nasceu morto; - que o cabra é um suplicante deboxado que nunca soube
respeitar as famílias, tanto que quis também fazer comxumbranças com a Quitéria
e Clarinha, que são moças donzellas, e não conseguio porque ellas repugnaram e
deram aviso a polícia;- que Manoel Duda é um sujeito perigoso e que não tiver
uma causa que atalhe a perigança delle, amanhã está metendo medo até nos homens
por vias das suas patifarias e deboxes; - que Manoel Duda está em pecado mortal
porque nos Mandamentos da Igreja é proibido desejar a mulher do próximo (...);
- que sua Majestade Imperial (...) precisa ficar livre do cabra Manoel Duda
para secula, seculorum amém, arrefem dos deboxes e semveregonhesas por elle
praticados.
POSTO
QUE:
Condeno
o cabra Manoel Duda, pelo malifício que fez a mulher do Xico Bento (...) a ser
CAPADO, capadura que deverá ser feita A MACETE.
A
execução deverá ser feita na cadeia desta Villa, Nomeio carrasco o Carcereiro.
Feita a capação depos de 30 dias o mesmo Carcereiro solte o cujo cabra para que
se vá em paz. O nosso prior aconselha – Homine debochado eboxatus mulherorum
inovocabus est sententias quibus capare est macete macetorim carrascus sine
facto nortre negare pete.
Cumpra-se
e apregue-se editaes nos lugares publicos. Apelo ex oficio desta sentença para
o Dr. Juiz de Direito desta Comarca.
Porto de Folha, 15 de outubro de
1833
a)
Manoel Fernandes dos Santos, Juiz Municipal
suplente em exercício”.
Cesar Vanucci - Jornalista,
advogado, membro da Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais (da qual é
o atual presidente), do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, da
Academia de Letras do Triângulo Mineiro e da Academia Mineira de Leonismo. cantonius1@yahoo.com.br)