Publicado em 29/10/2018 - cesar-vanucci - Da Redação
“O “sumiço” do jornalista, o “suicídio” do vereador, a “renúncia” do chefe da Interpol documentam, mais uma vez, o que os regimes ditatoriais são capazes.” (Antônio Luiz da Costa, Professor)
Governos de características despóticas, contumazes na
violação dos direitos fundamentais, acabam de protagonizar novas censuráveis
ações de repercussão mundial.
Um dos incidentes impactantes ocorridos implica o
reino saudita. Escorada numa estrutura de poder medieval, que comporta até
mesmo tolerância em relação à escravatura, a monarquia árabe mantem-se
totalmente fechada às conquistas civilizatórias. A Arábia abriga em seu
território o local considerado mais sagrado da fé islâmica. Isso lhe confere
influência considerável no jogo político regional. Detentor de enormes reservas
petrolíferas, exploradas em consórcio com as maiores empresas americanas e
europeias do ramo, o país desfruta de prestígio injustificável por parte dos mandatários
das potências mundiais, por conta de espúrias conveniências geopolíticas. Seus
parceiros empenham-se em ocultar os delitos frequentes perpetrados pelo regime
contra os direitos humanos.
Maquinações cavilosas apontam a realeza saudita como
reformista, modernizadora, modelar na defesa dos postulados democráticos. Mas
não são suficientes para impedir que muitos analistas de política internacional
tragam ao conhecimento público a asfixiante situação em termos de respeito à
dignidade humana vigente nos domínios árabes. O escritor e jornalista Michael
Moore sustenta que, naquele pedaço do mundo, fica localizada a fonte matricial
do fundamentalismo muçulmano. Fundamentalismo esse responsável pela existência
do ISIS, Al-Qaeda e outras sinistras organizações. Embora os dirigentes
saudistas aleguem combater as falanges extremistas, nos bastidores, atuam em
sentido totalmente inverso, afirma Moore.
O que ocorreu no dia 2 de outubro passado, na Turquia,
é uma amostra tétrica do sufocante clima de repressão praticado pelos sauditas.
O jornalista Jamal Khashoggi, colunista do Washington Post, crítico do governo
e da aliança dos monarcas com Donald Trump, compareceu ao consulado saudita em
Istambul para regularizar papéis referentes a seu enlace matrimonial. Sua noiva
ficou a aguardá-lo do lado de fora. O jornalista nunca mais foi visto. De
acordo com a segurança turca, foi sequestrado, torturado, morto e esquartejado.
Estranhas movimentações na sede do consulado, rastreadas pela polícia turca,
informaram o mundo do “desaparecimento”. Pressionados a se explicarem,
ameaçados com sanções, os dirigentes sauditas limitam-se a dizer que promoverão
retaliações contra os que os censuram.
Afogada em caos político e econômico, devido a
desatinos sem conta cometidos por governantes despreparados, desafeiçoados ao
diálogo democrático, nossa vizinha Venezuela assume, outra vez mais,
notoriedade negativa no palco dos acontecimentos mundiais. Às voltas com o dilacerante
drama dos refugiados, criticada acerbamente pela repressão à liberdade de
expressão, pelas violências contra os que discordam da orientação caudilesca
dominante, o governo Maduro é acusado agora da eliminação, em circunstâncias
cruéis, de um adversário político. A vítima, um vereador, foi conduzida à sede
da temida polícia política. De acordo com a versão oficial, pôs termo à vida,
esmagado diante das provas acumuladas de sua participação em delito contra o
Estado, atirando-se de uma das janelas do edifício em que se achava detido. Os
indícios, entretanto, são de que ele não se jogou, foi jogado depois de “severo
interrogatório”...
A China também ganhou evidência por ato chocante,
revelador da falta de transparência e desdém com que trata, no seu estilo
autocrático de conduzir as coisas, a comunidade das nações e a opinião pública.
O presidente da Interpol, chinês Meng Hongwei, que acumula o posto de
Secretário de Segurança em seu país, deixou a sede da organização, em Lion,
França, para uma viagem de curta duração a Pequim. Como não mais desse qualquer
notícia, por bom pedaço de tempo, para familiares e subordinados, depois de
pisar no solo chinês, a Interpol resolveu acionar o Governo com pedido de
esclarecimento. A resposta demorou a ser dada: Meng estava detido por acusações
não devidamente especificadas. Por tal
razão “resolveu renunciar” ao comando da Interpol. O embaraçoso episódio
consignou a impressão de que o cidadão citado foi alvo de um dos tradicionais
“expurgos” que pontuam o jogo pelo poder político no sistema comunista. Na
comunidade internacional afloraram questionamentos a respeito da forma
desrespeitosa com que a China lida com organizações, à feição da respeitável
Interpol, que mantêm atividades conectadas com os países em função de tratados
por eles referendados.
Cesar Vanucci - Jornalista
(cantonius1@yahoo.com.br)