Toque de Recolher

Publicado em 07/05/2009 - cidade -

Conselheira Tutelar diz que medida pode ser adequada em Muzambinho - Na edição anterior, este semanário informou que seis municípios do interior de São Paulo implantaram o “toque de recolher” para menores de idade. Juízes de Varas de Infância e Juventude estabeleceram regras rígidas quanto à permanência nas ruas durante as noites dos menores em situações de risco. Tomaram a decisão com o objetivo de diminuir a delinqüência, atendendo assim a um clamor da sociedade. Jovens com menos de 18 anos não podem mais ficar fora de casa após as 23h sem a companhia de um responsável.  Quem estiver na faixa até 14 anos de idade, não pode ficar nas ruas sem a companhia de pais ou responsáveis após as 20h30. Os adolescentes entre 14 e 16 anos devem ir para casa às 22h e entre 16 e 18 anos, às 23h. Após a medida foi possível verificar que o número de pequenos furtos e a reincidência dos menores caiu sensivelmente.
Nesta semana, nossa reportagem desde semanário buscou conhecer a opiniões de autoridades em Muzambinho. Mas adianta que o tema merecerá amplos debates nas próximas semanas.
A conselheira tutelar Dilmara Rondinelli manifestou a sua confiança de que a intenção da medida é bastante positiva. Se colocando favorável à medida, entende que cada município deve fazer uma adequação à sua realidade. De qualquer forma, manifestou que o debate do tema é de fundamental importância. Até porque hoje a grande dificuldade enfrentada é o fato dos pais transferirem a educação e a responsabilidade pelos filhos para o Conselho Tutelar. Hoje, todos os problemas do conselho derivam da família, sendo atendidas cerca de dez ocorrências diárias.
Dilmara salienta que as medidas podem ser implantadas em Muzambinho, mesmo sendo consideradas polêmicas. Alertou que a cidade tem muitos problemas como tráfico de drogas, prostituição, abuso sexual e outros. “Estamos com problemas em excesso no município envolvendo os menores. Acho que é uma coisa que deve ser muito bem pensada e que pode funcionar”, disse.

Para Promotora da Comarca, autoridade deve ser exercida pelos pais - Ganhou espaço, nos veículos de comunicação, a discussão acerca das vantagens e desvantagens da instituição, pelo Poder Judiciário, de regras acerca do horário em que crianças e adolescentes não mais deveriam permanecer às ruas – o chamado “Toque de Recolher” –, após reportagem exibida pelo Fantástico, tendo, inclusive, sido veiculada matéria a respeito neste semanário.
Instados a nos manifestar a respeito de palpitante tema, entendemos, a nosso modesto aviso, que a questão não pode deixar de ser analisada sob o prisma da família, como “celula mater”, ou seja, base da formação de toda e qualquer sociedade.
Conceitualmente podemos definir a família como um grupo de pessoas com laços de consangüinidade, de aliança, de afinidade, de afetividade ou de solidariedade, cujos vínculos circunscrevem obrigaçnculos circunscrevem obrigadade ou de solidariedade, cujos vões recíprocas, organizadas em torno de relações de geração e de gênero. Portanto, arranjos familiares diversos devem ser respeitados e reconhecidos como potencialmente capazes de realizar as funções de proteção e de socialização de suas crianças e adolescentes.
A família, independente de seu formato, é a mediadora das relações entre os sujeitos e a coletividade, porquanto o núcleo familiar é o primeiro ambiente em que a criança toma contato com a vida social. É a partir dali que ela irá construir todos os seus valores e suas crenças.
É na família que, pela própria proximidade física que geralmente se mantém, pode-se, em primeiro lugar, conhecer as necessidades, deficiências e possibilidades da criança, estando, assim, apta a dar a primeira proteção. Também em relação ao adolescente, é na família, como regra geral, que ele tem maior intimidade e a possibilidade de revelar mais rapidamente suas carências e expectativas.
Por tais razões é que o reconhecimento da importância da família no contexto da vida social encontra-se explícito no artigo 226 da Constituição Federal do Brasil, na Convenção sobre os Direitos da Criança, no Estatuyo da Criança e do Adolescente, na Lei Orgânica da Assistência Social e na Declaração de Direitos Humanos.
À vista de tais considerações, é lógica e razoável a atribuição de deveres e obrigações à família, a qual é juridicamente responsável perante a criança e o adolescente, mas, ao mesmo tempo, também se encontra comprometida com a comunidade e a sociedade a que pertence.
Para tanto, aos pais é garantido o exercício do Poder Familiar, o qual nada mais é que o complexo de direitos e deveres concernentes ao pai e à mãe, em igualdade de condições, direcionado ao interesse da família e do filho menor não emancipado, que incide sobre a pessoa deste último e serve como meio para mantê-lo, protegê-lo e educá-lo.
E é justamente dentro deste contexto que consideramos que a intromissão exarcerbada do Estado nesta tarefa, sobretudo na de educar os filhos, pode se mostrar extremamente prejudicial à construção da relação paterno-filial, acabando por enfraquecer a autoridade que tem e deve ser exercida pelos pais, cotidianamente, no desempenho das atribuições que lhes são inerentes.
Melhor dizendo, a partir do momento em que a tarefa de fixar horários e estabelecer regras gerais e indiscriminadas sobre o recolhimento de jovens às suas residências é transferida da figura dos pais ao Estado, estar-se-á subtraindo dos primeiros a possibilidade de agirem segundo seus critérios e princípios, atendendo às peculiaridades e individualidades de seus filhos.
Nesta hipótese, estaria ocorrendo uma transferência de responsabilidades que em nada auxiliaria no fortalecimento dos vínculos entre pais e filhos menores. Ao contrário, acabaria por distanciá-los ainda mais. 
Isso, todavia, não quer dizer que o Estado deva se manter omisso nas questões relativas à infância e juventude. De forma alguma. Em respeito ao princípio da prioridade absoluta à garantia dos direitos da criança e do adolescente, o Estado deve se responsabilizar por oferecer serviços adequados e suficientes à prevenção e superação das situações de violação de direitos, possibilitando o fortalecimento dos vínculos familiares e sócio-comunitários.
Cabe, portanto, ao Estado, apoiar/auxiliar – e não substituir – as famílias e seus membros, garantindo a estes o acesso a serviços de educação, saúde, geração de trabalho e renda, cultura, esporte, assistência social, dentre outros.
De igual maneira, o Poder Judiciário, o Ministério Público, o Conselho Tutelar e a própria Escola têm papéis importantes no processo de desenvolvimento de crianças e adolescentes. Entretanto, nenhum desses Órgãos e Instituições poderá substituir a imprescindível e necessária atuação dos pais na formação e educação de seus filhos.
Nenhuma medida que venha a ser aplicada surtirá os efeitos desejados se a criança e o adolescente não tiverem uma base sólida, uma família que realmente esteja preocupada com sua criação, que se comprometa e que queira repassar valores, limites e exemplos que serão guardados por toda a vida.
Posta a questão nestes termos, e respeitando as opiniões em contrário, acreditamos que o Estado – aqui nos referindo aos Poderes Constituídos – deveria voltar suas atenções ao fomento de políticas integradas ao apoio e orientação às famílias – sobretudo àquelas que se encontram em situações de risco, geradas por processos de exclusão social e cultural – e não se arvorar em suprimir direitos e deveres que sempre foram e continuarão sendo inerentes à belíssima, mas árdua, tarefa de ser PAI/MÃE.
Encerrando nossas considerações, gostaríamos de deixar registrado um trecho extraído da Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada pela Assembléia Geral das Nações Unidas:
“A família é o lugar normal e natural de se efetuar a educação, de se aprender o uso adequado da liberdade, e onde há a iniciação gradativa no mundo do trabalho. É onde o ser humano em desenvolvimento se sente protegido e de onde ele é lançado para a sociedade e para o universo.”