Publicado em 30/08/2017 - especial - Da Redação
“O sal e o lírio” é o mais recente e o sétimo livro publicado da escritora guaxupeana Francisca Vilas Boas, radicada no Rio de Janeiro desde 1973, onde se pós-graduou em Letras e Direito. Por mais de 30 anos, ela lecionou Literatura Brasileira e Língua Portuguesa. Começou na Facig (atual Unifeg).
Os dois primeiros livros de contos – “O Sabor Humano” e “Roteiro de Sustos” - foram premiados e editados pela Imprensa Oficial de Belo Horizonte, em 1971 e 72. Ela também participou de antologias e se tornou conhecida como uma das pioneiras, no Brasil, do gênero miniconto, juntamente com os escritores Elias José, Sebastião Rezende e Marco Antônio Oliveira. Atualmente, a Casa de Cultura de Guaxupé desenvolve um projeto de valorização e resgate do miniconto originado no município, mediante registros diversos sobre esse pioneirismo.
Francisca só voltou a publicar em 2011, depois de exercer as funções de advogada, professora e oficiala de Justiça Federal, no Rio. Sob indicado do MEC, ela representou o Brasil em um curso ibero-americano, na Espanha, em 1983 e 84. O retorno à literatura foi com o livro de poemas “A asa e osso” (Ed. Galo Branco). A partir de 2014, publicou quatro livros pela Editora Scortecci, incluindo o mais recente. “Das Ilusões e da Morte” (contos) e “Palavras e Sombras” (poemas) tiveram edição bilíngue – português / espanhol. Ambos foram autografados na 1ª Flig – Feira de Literatura de Guaxupé. Francisca Vilas Boas foi a primeira patrona homenageada neste evento.
“A Sombra dos Inventados” (contos) é de 2016. Agora, “O Sal e o Lírio” retoma a linguagem poética e revela qualidades ainda mais apuradas. Poucas palavras dizem muito. Gestos de sal e feridas caminham lado a lado através de um silente ou gritante eu lírico.
Lirismo e salinidade
Em “O sal e o lírio”, a poeta Francisca Vilas Boas escreve sobre afetos germinais, ilusões, ilhas inacessíveis de encontros, corpos que enrugam a paisagem. No campo afetivo, aqueles que foram provar das fábulas se extraviaram.
Familiarizada com as dobras do tempo, o desrumo, o calendário das almas e os inventários do abandono, a poeta questiona: “a ferida sonha? O corpo é seu refém?” Enquanto isso, “deus se tornou imagem de museu” e há excesso de sal nos súbitos da rua. Um homem mata e tinge de sangue o branco do espaço, mas o caos dessangra.
As lembranças dos pomares da infância e os lírios que refletem arco-íris fazem alusão a Guaxupé e Minas Gerais. O Rio de Janeiro pode ser encontrado entre belezas e máquinas do mundo. Em qualquer lugar há solidão e “a barca da morte atravessa o deserto das almas.” Ainda bem que as mulheres (incluindo a autora) emprestam doçuras ao sombrio.
A gramática do mundo foi deletada, na visão da escritora. Sem perder o refinamento literário, Francisca registra a atual (in)comunicabilidade humana, em que o diálogo agoniza. No entanto, com doçura farta e uma pitada de sal, há grande sensibilidade ao descrever um amor de pai no primeiro contato com o filho - predestinado “a reescrever-te, a semear-te.” A mulher, tão traduzida e tão enigmática, ganha poéticas de beleza e fortaleza. É fruto sobre a terra a urdir sua história de silêncios.
Vasto, profundo e envolvente, “O sal e o lírio” pode ser definido em um verso do livro: “o homem caminha agasalhado no frio do próprio abraço.”
O novo livro de Francisca Vila Boas está à venda no site www.scortecci.com.br e em bancas de jornais e revistas de Guaxupé (a partir de 06 de setembro).
Sílvio Reis, jornalista