ARTIGO ESPECIAL: O País do espetáculo

Publicado em 19/11/2013 - geral - Da Redação

“O dia que o juiz decidir para satisfazer sentimento pessoal ou dar satisfação à sociedade, o cidadão não dormirá tranquilo”, - MILTON BIAGIONI FURQUIM/Juiz de Direito em Guaxupé e autor da matéria

Creio que não há um só brasileiro que não aguardasse por esse momento - a condenação e a prisão dos mensaleiros. Parece-me que a condenação e a prisão lavaram a alma e devolveram a confiança do brasileiro na justiça tupiniquim e, por certo, consolidou de vez o império da democracia.

No entanto há que se lembrar, sobretudo em um estado democrático de direito, que a observância e respeito às regras postas em nosso ordenamento jurídico é de fundamental importância para que não percamos o foco de que as decisões judiciais são para ser respeitadas e cumpridas, mais, para a garantia da plena justiça.

Eu, também, como brasileiro, em que pese, inicialmente, ter tido minhas dúvidas quanto ao desfecho do processo, sinto-me feliz e reconfortado pela conclusão do processo e consequente condenação e prisão dos corruptos, embora com muito atraso, mas compreende-se pela complexidade do processo e a existência de vários réus. Parece-me que, até que em fim, a prisão não é somente para o preto, o pobre e a puta.

Ora, o que a sociedade jamais pode ignorar é que ninguém, repito, ninguém pode ser condenado criminalmente sem um mínimo de provas, seja rico, seja pobre. Ninguém pode ser condenado criminalmente sem que a acusação produza, minimanente, provas, seja preto, seja branco. Ninguém pode ser condenado porque a opinião pública quer a condenação, seja prostituta ou seja beata.

A sociedade precisa entender de vez que o juiz jamais deve condenar quem quer que seja apenas para dar satisfação a opinião pública. O juiz que condenar alguém, sem um mínimo de provas, até porque, conforme preceito constitucional, na dúvida deve absolver-se, não é digno de vestir a toga, não é digno de estar investido de autoridade, não é digno de representar o Poder Judiciário.

O dia que o juiz decidir para satisfazer sentimento pessoal ou dar satisfação à sociedade, o cidadão não dormirá tranquilo. A função precípua do magistrado é fazer Justiça, e fazer justiça é dar a cada um o que é seu. É garantir, ainda que haja toda forma de pressão, tentativa de interferência e ingerência, o direito do cidadão, seja ele inocente, seja ele culpado, lembrando que mesmo o criminoso tem direitos mínimos que devem ser assegurados independentemente do crime cometido.

Agora, se a sociedade não está satisfeita com decisões judiciais, com penas aplicadas, então que em vez de criticar que lute para que tenhamos leis mais rigorosas, porque enquanto não as tivermos, teremos – juízes e cidadãos, que submetermos a lei existente e em vigor.

Mas uma coisa jamais pode ser olvidada, o respeito e obediência às regras processuais em vigor, para que o cidadão, seja ele quem for, ainda que personalidades tidas por 'intocáveis', sinta-se seguro, tranquilo e certo de que seus direitos não serão violados, pois lembre-se de que a pior das ditaduras é a do Judiciário. A garantia jurídica deve ser preservada a qualquer custo.

No caso do mensalão, por certo, não defendo impunidade. Pelo contrário. Por outra, nunca devemos esquecer que defender a transgressão de direitos é algo absurdo, inconcebível, repugnante. O cidadão, seja ele técnico em direito, seja ele desconhecedor do direito, que o Estado Democrático de Direito, e qualquer acadêmico sabe bem disso, foi concebido para haver leis, mais, respeito a elas, com isso objetivando evitar-se outras transgressões, enfim, fazer com que haja segurança jurídica. Que há corrupção neste País, por certo que existe, e isso não é novidade para ninguém. Sempre houve. Que toda forma de corrupção deve ser punida, claro que sim e de forma exemplar em respeito ao cidadão trabalhador e cumpridor de seus deveres.

Agora, o que não se admite; o que não se tolera é transgredir direitos, pois assim, ao transgredi-los, estará abrindo ensanchas, brechas para novas transgressões, motivadas sabe lá por quais intenções, pessoais ou não. Ah, dar pronta satisfação a opinião pública? Impensável, pois não se decide jamais para dar satisfação a opinião pública, pois se assim fosse estaríamos recuando a época de Roma antiga.

Parece-me que neste País só um único homem sabe e conhece o Direito. Parece-me que somente o Presidente do Supremo Tribunal Federal está 'ungido' do senso de Justiça. Parece-me que somente ELE, e mais ninguém, nem seus pares Ministros, conhecem o Direito. Parece-me que nesta sanha de Poder não pensa por minuto sequer em desfazer, desmerecer, desconsiderar, e de forma mal educada, seus pares Ministros. Parece-me, e a realidade não mente, que gosta do aplauso do incauto cidadão que é sempre movido pelos manipuladores de opiniões de plantões e, confesso que neste quesito é imbatível. Explica-se: sua aposentadoria compulsória não tarda e seguir pelos caminhos da política é o caminho mais fácil. Terá, com certeza, uma votação expressiva.

O Ministro Presidente do Supremo Tribunal Federal, ao determinar a prisão imediata da forma que feita transgrediu preceitos processuais penais por oportunismo, como já dito, pela busca de visibilidade, anseiando por cargos outros após sua merecida aposentadoria.

Qualquer acadêmico de direito que tenha um mínimo de conhecimento do Código de Processo Penal sabe que os presos tem o direito de cumprir suas penas em seus Estados de origem e não justifica de maneira alguma a espetacularização da transferência dos presos em avião para Brasília, além do que os presos se entregaram de forma expontânea. Mais outro absurdo, Existem presos condenados no regime semi-aberto e nesse regime deverão dar início ao cumprimento de suas penas imediatamente e, no caso, ficarão aguardando que tal aconteça no regime fechado desnecessariamente. Por certo cabe, inclusive, ação por danos morais, isto por cumprir pena em regime no qual não foi condenado, ação esta em face do Estado e de quem determinou o cumprimento imediato da prisão da forma que feita.

Enquanto isso, aguardemos novos episódios

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