Estudante de Muzambinho relata experiência em Estação na Antártida

Publicado em 28/02/2012 - geral -

Na madrugada do sábado, dia 25/02, o Brasil foi surpreendido com um incêndio que destruiu quase que totalmente a Estação Comandante Ferraz, na Antártida. A base de pesquisas científicas da Marinha brasileira abrigava 45 pessoas, entre militares e pesquisadores. O incêndio começou na área dos geradores de energia da estação e causou a morte de dois militares: Suboficial Carlos Alberto Vieira Figueiredo e primeiro-sargento Roberto Lopes dos Santos.
O fato é que um jovem estudante muzambinhense passou 28 dias do mês de janeiro deste ano exatamente na Estação Comandante Ferraz e conviveu com os militares e pesquisadores.

André Geraldo de Lima Moraes, 23 anos, falou à nossa reportagem sobre a experiência profissional vivida no continente gelado, as condições do local, a amizade com os militares falecidos e possível causa do acidente.

ENGENHEIRO AGRÔNOMO CURSANDO MESTRADO
Filho do casal Geraldo Magela Moraes e Maria José de Lima Moraes, oriundos de Muzambinho e atualmente residentes em Juruaia, o jovem André foi aprovado em vestibular e concluiu o curso de agronomia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) no ano passado. Assim, iniciou o curso de mestrado em engenharia agronômica e ciências do solo na mesma universidade carioca.

 

 

 

 

O curso de ciências do solo estuda como o solo é trabalhado. André então passou a estudar como o solo é formado: a partir das rochas, por que os solos de partes altas são de uma maneira e de partes baixas de outra, por que é fértil ou não, e como classificar o solo (ordem, subordem e classe) para o engenheiro entender todas as características do solo. Também está iniciando o trabalho de mapeamento dos solos.

EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL NA ANTÁRTIDA
Iniciando o curso de mestrado, em meados do ano passado André foi convidado para participar de um projeto na Antártida. Conseguiu então a vaga e participou de um treinamento pré-Antártico. Em seguida, foi aprovado em primeiro lugar na prova do mestrado entre 53 candidatos.
André explica que o PROANTAR – Programa Antártico Brasileiro, é muito grande, contando com biólogos, geólogos, arquitetos e outros profissionais. O muzambinhense participou do TERRANTAR – Ecossistemas Terrestres da Antártida. O projeto tem uma linha de pesquisa sobre monitoramento climático em oito pontos na península e em vários outros pontos, totalizando 18. É feito monitoramento da temperatura do ar e do solo em várias profundidades, avaliando a influência climática na camada ativa de “permafrost” (camada do solo permanentemente congelado). Em outra área do projeto, o muzambinhense trabalhou com a dinâmica de periglaciais. Por fim, atuou no mapeamento de solos, com caracterização química, física e hidrológica da península.

CONVIVÊNCIA COM PESQUISADORES DO MUNDO INTEIRO
No dia 07 de janeiro de 2012, André partiu para a Antártida, retornando no dia 07 de fevereiro. Permaneceu durante 28 dias no continente Antártico. Relatou que a Estação Comandante Ferraz é uma base brasileira que desenvolve vários tipos de pesquisas, sob a segurança da Marinha. Porém, recebe visitas de pesquisadores de toda a parte do mundo. Ao lado, existe uma estação chilena. Na mesma baia, existe uma estação polonesa, com proximidade de uma estação peruana. Passou perto de estações da Rússia, Argentina e China. Já na estação brasileira, presenciou a visita e conviveu com argentinos, alemães, chilenos, peruanos e poloneses. “Foi uma experiência muito rica. Sentar e conversar com pesquisadores de outros países”, disse. Neste período, a estação contava com 62 brasileiros.
André relatou que a baixa temperatura não foi problema neste período de verão na Antártica. Até porque a média era de 0 grau, com vários dias de temperatura positiva. O frio mais intenso foi de apenas 3 graus negativos. Além disso, a Marinha fornece o melhor equipamento possível. O muzambinhense fala com satisfação do trabalho emocionante no campo. Chegava a caminhar por 8 horas diárias, coletando amostras e carregando no retorno cerca de 15 quilos na mochila.

INCÊNDIO E MORTE DE DOIS AMIGOS
Quatorze dias depois que retornou para o Brasil, André foi surpreendido com o incêndio ocorrido na Estação brasileira na Antártida. Confessou que ficou “chocado” e assustado com o fato, acompanhando as notícias pela televisão. Até porque era amigo dos dois militares que faleceram no local. Na convivência com os militares, participava de atividades, jogos, conversas e conheceu as famílias através de fotos. Os militares sempre participavam das caminhadas em busca das amostras. O militar Roberto Lopes dos Santos, chamado de “Santinho”, o ajudou conseguindo um aquecedor extra para secar as amostras. “É uma família que se forma lá dentro”, disse emocionado o muzambinhense.
André relatou que a Estação tem um alarme de incêndio que dispara somente pelo fato de uma “pizza queimar”. Portanto, a estação é bem estruturada e os militares são bem preparados, inclusive com treinamento de operações especiais. Assim, acredita que o incêndio tenha sido causado inicialmente por uma explosão. Até porque o incêndio aconteceu de forma muito rápida e atingiu praticamente toda estação.
O muzambinhense explicou que os geradores, onde o incêndio teve início, ficam do lado oposto do alojamento. Portanto, a quase 100 metros de distância de onde permaneceu. Relatou ainda que o vento é constante, numa média de 70 km/hora. Em determinados momentos, os pesquisadores ficam impedidos de sair para trabalhar. Portanto, sempre houve muito cuidado com a segurança de todos.
Indagado sobre seu sentimento, André foi direto: “Primeiro de susto, pois nunca imaginava que algo desta natureza pudesse acontecer lá. A perda humana é muito grande. Eles são heróis, pois salvaram a todos”. André relatou ainda que manteve contato com muitas pessoas que estavam na estação, sendo que relataram os momentos vividos de apreensão.

RETORNO INVIABILIZADO
O retorno de André para a Estação Comandante Ferraz estava marcado para o dia 06 de março. Porém, sofreu lesões nos dois joelhos durante o trabalho realizado na estação e seu retorno ficou inviabilizado. Além disso, com o incêndio ocorrido, os trabalhos foram suspensos no local. Relatou ainda que o projeto da UFRRJ deixou no local 2 GPS (no valor de R$ 60 mil cada), além de um radar de solo (com valor aproximado a R$ 300 mil). Por outro lado, André conseguiu trazer todo o material colhido no solo Antártico, o que será de grande importância para a universidade carioca.
Finalizando sobre a experiência vivida, André disse: “Dá vontade de levar todo mundo pra lá. Acho que todos deveriam ver o por do sol na geleira ou fazer amizade rápida como aconteceu comigo. São amigos que vou levar para a vida inteira. O clima lá é bem caloroso”.