Nova indústria de café da Nestlé, por Jânio Zeferino da Silva

Publicado em 25/08/2014 - geral - Da Redação

Acompanho o processo de instalação da nova fábrica de café monodose da Nestlé desde o seu início.

Sei que os líderes da produção e da indústria tem posições antagônicas e convergentes neste caso.

Convergem na defesa do seu subsetor da cadeia produtiva e divergem quanto a forma de atender o pleito da multinacional.O que se discute é a concessão ou não de autorização exclusiva para a importação de café de outras origens para preparação dos blends que serão produzidos na nova planta industrial.

Há muito tempo a indústria nacional de solúvel luta pelo drawback e até o momento não há consenso sobre o tema.

Existe uma "barreira não-tarifária" que é a falta da ARP-Análise do Risco de Pragas que impede a importação, já que sob os aspectos econômicos, fiscais e tributárias não há nenhuma restrição.

O argumento da indústria de solúvel é de que o Brasil tem capacidade instalada e mercado para transformar 4 a 5 milhões de sacas de café em solúvel e só consegue processar 3,5 milhões há vários anos pela falta e custo elevado do robusta brasileiro, o que vem enfraquecendo

A indústria da torrefação teme a entrada, através das grandes redes de varejo, de produto importado mais competitivo pelas vantagens fiscais dos países da Ásia, África e União Européia.

A produção alega concorrência dos cafés asiáticos e africanos que chegariam mais baratos e prejudicariam a colocação dos cafés inferiores no mercado interno.

A Nestlé sinaliza com a nova indústria que agregará valor ao café, aumento de empregos, exportações e ao mesmo tempo pede um "privilégio" mesmo que temporário de importar livre das amarras burocráticas atuais.

Todos tem suas razões, argumentos e propostas.

Quero aprofundar um pouco sob o ponto de vista de todos os intervenientes e ao final dar a minha opinião:

Nestlé - usa muito café brasileiro em todo o seu mix de produtor e a nova planta reduzirá muito seu custo de produção, além de criar uma plataforma mundial de exportação para seus principais mercados;

Indústria do solúvel - fica neutra mas apóia discretamente porque vê a possibilidade de ter seu pleito histórico de drawback atendido por insonomia;

Indústria da torrefação - contrária porque será uma vantagem fiscal muito grande para o maior empresa do setor. Além disso, tem o risco das redes de varejo aproveitarem a situação e importarem ou ameaçarem importar forçando a redução das margens e a participação no mercado interno que é o 2o maior do planeta;

Cafeicultores - contrários por entenderem que a importação causará queda nos preços e tem o mesmo temor da indústria de torrefação, já que a entrada de café torrado do exterior vai gerar excedentes nos cafés inferiores tradicionalmente direcionados para o mercado interno e de solúvel. O que fazer com o PVA-pretos, verdes e ardidos que representam cerca de 15% da produção nacional?

Governo Federal - quer mais indústria, emprego e agregação de valor, mas como controlar a entrada do produto importado sem ferir as regras da OMC e demais acordos internacionais?

Agora gostaria de opinar. Esse pleito vai forçar o setor a dar um passo adiante no que se refere a posição do Brasil no mundo cafeeiro, a partir de umas questões objetivas:

- o mundo prefere o café robusta porque ele é mais barato e produtivo;

- hábito de consumir café começa pelo café solúvel que utilizar cerca de 85% de robusta na sua composição;

- países asiáticos e leste europeu são os novos mercados para o café. Os ricos como Coréia do Sul querem café de qualidade e nós temos produção para atendê-los. Os demais querem preço e aí sem uma oferta abundante de robusta continuaremos perdendo participação para o Vietnã e Indonésia como vem acontecendo atualmente, e, pior ainda, abrindo espaço para novos entrantes como Laos e Camboja.

Quanto ao arábica, a guerra da qualidade no mercado internacional já está perdida para a Colômbia e América Central. Nossos cafés são tão bons quanto os deles, porém como convencer os consumidores? Enquanto o setor privado esperar que o Governo faça tudo sozinho e não colocar a mão no bolso para ampliar as campanhas promocionais continuaremos a ouvir lamentações e nenhum resultado prático.

Com a palavra as lideranças para com maturidade, equilíbrio e pensando nos 1.900 municípios, 2,3 milhões de ha, 12 milhões de produtores, US 6 bilhões de exportações, mais de 300 anos de história que construíram as bases do desenvolvimento nacional. Palavras claras, transparentes e responsáveis!

É o que penso!

Janio Zeferino da Silva - Consultor de agronegócios