Publicado em 18/11/2014 - geral - Da Redação
Uso predatório, excesso de recursos, ações repetitivas nos tribunais, além da falta de estrutura são os principais entraves à celeridade nos tribunais
O CNJ mostra ainda a alta taxa de congestionamento da Justiça está concentrada nas ações de execuções fiscais. Elas representam 40% do estoque de processos pendentes, que podem demorar mais de cinco anos para tramitar. De cada 100 processos, apenas nove foram baixados em 2013. São assuntos relacionados à cobrança de impostos, muitas vezes de valores irrisórios, que lotam os escaninhos da Justiça.
Alguns juízes têm sob sua responsabilidade mais de 300 mil ações de execuções fiscais. Os litigantes são os responsáveis pela gestão pública e, muitas vezes, recorrem ao Judiciário mesmo quando sabem que a derrota é garantida. Há casos em que cobram dívidas de R$ 5. Cada processo individual custa, em média, R$ 900.
Se de um lado as prefeituras, o Estado e a União buscam a Justiça para cobrar o cidadão comum, de outro, as empresas que desrespeitam os direitos dos consumidores são acionadas diariamente nos tribunais. Muitas dessas ações são repetitivas e ingressadas de maneira individual.
O presidente da AMB, João Ricardo Costa, dá um exemplo para mostrar a facilidade com que esses processos fazem crescer o volume de conflitos que chegam aos tribunais. “Se uma empresa de telefonia apera um botão e, pelo computador, desconta indevidamente R$ 2 de 10 milhões de clientes, caso 10% deles ingressem com uma ação individual, isso resultará em um milhão de ações. Esse exemplo mostra porque estamos atrasados. O juiz fica dando sentença repetitiva”, destaca.
De acordo com o CNJ, dos 20 maiores litigantes da Justiça, mais da metade é composta por instituições bancárias. Neste rol de companhias que desrespeitam de forma contumaz os direitos dos consumidores, estão incluídas ainda empresas de planos de saúde e de telefonia. Segundo João Ricardo, as leis brasileiras permitem que os grandes demandantes façam uso indevido de recursos na Justiça. Em alguma situações, existem casos que ultrapassam 80 ações recursais. O problema é que muitas delas são apenas protelatórias, para ganhar tempo, e impedem o descongestionamento da Justiça.
A situação é preocupante. “A sistemática de recursos desprestigia claramente as decisões de primeiro grau, uma vez, que impede que, via de regra, tenham efeitos práticos imediatos”, diz o vice-presidente institucional da AMB, Sérgio Junkes. Diante disso, assuntos considerados de menor relevância, como o furto de um chinelo de R$ 16, por exemplo, acabam parando no Supremo Tribunal Federal (STF). “Esse tipo de demanda não deveria estar na Corte Suprema”, acrescenta.
Em tramitação no Congresso Nacional, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 15/2011 revê as inúmeras quantidades de recursos existentes no Judiciário. O projeto foi modificado no Senado. A AMB defende o texto original, idealizado pelo ex-ministro do STF César Peluso.
CAMPANHA - A Associação dos Magistrados Brasileiros também tem se posicionado de forma contrária ao uso predatório da Justiça e desenvolve uma campanha para que os serviços prestados à sociedade possam trazer mais celeridade e melhores resultados. Junkes diz que o uso predatório prejudica o andamento de processos que envolvem questões relacionadas à cidadania. Atrapalha as ações de pessoas que precisam de uma resposta rápida do Judiciário em assuntos vitais, como a saúde. “Pesquisa do CNJ mostra que boa parte da avalanche de demandas não deveria estar no Judiciário e está relacionada, por exemplo, a estratégias comerciais, para o funcionamento de empresas”, garante.
Embora tenha conhecimento de que os maiores litigantes são as grandes companhias, quem trabalha com essas demandas não consegue entender por quê essas empresas desrespeitam, de forma contumaz, o Código de Defesa do Consumidor. Para isso, a AMB vai encomendar uma pesquisa que, além de mapear esses grandes demandantes, responda a esses questionamentos.
MINAS REDUZ AÇÕES DE EXECUÇÕES FISCAIS – O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) baixou duas portarias para reduzir os litígios na área de execução fiscal. A medida foi implantada na gestão do desembargador Herculano Rodrigues.
Levantamento feito pelo consultor Jair Santana, especialista na área de
estão pública, mostra que a medida, adotada no fim do ano passado, já começa a surtir efeitos. “Na Comarca de Santa Luzia, por exemplo, cerca de 20 mil processos deixaram de ser ajuizados”, exemplifica. A ideia é estimular acordos, oferecer incentivos ou mesmo perdoar dívidas pequenas, desde que as medidas não seja consideradas ilegais.
Um dado apresentado por ele chama a atenção: de um estoque de 6 milhões de processos no estado de Minas, 1,1 milhão é relacionado a execuções fiscais. Desses, 60% têm como origem os municípios. Cada processo custa entre R$ 4 mil e R$ 5 mil. Boa parte, porém, cobra débitos com impostos cujos valores são pífios, de R$ 12 por exemplo. “O estado e os municípios estão gastando para não cobrar, pois esses processos não andam”, destaca o consultor e ex-juiz.
Por Márcia Delgado, com colaboração de Rodrigo Fayad
FONTE: AMB INFORMA, nº 161, setembro de 2014, pgs 08 e 09