BOLIVARIANOS FICAM COM TROFÉU COBIÇADO PELA DIREITA BRASILEIRA

Publicado em 18/01/2019 - marco-regis-de-almeida-lima - Da Redação

BOLIVARIANOS FICAM COM TROFÉU COBIÇADO PELA DIREITA BRASILEIRA

O sonho da conquista de importante troféu por parte do governo brasileiro frustrou-se. Num primeiro momento o fracasso foi da transição golpista comandada por Michel Temer, que usou de muitos artifícios para tentar livrar-se da carapaça da corrupção, dentre eles a busca de um troféu internacional. O envolvimento do PMDB nas bandalheiras não se deu somente na parceria com as gestões petistas, mas, durante quase toda a Nova República, pois essa agremiação política foi presença assídua na antessala do poder durante quase toda esta etapa republicana.  Escândalos como Anões do Orçamento, Privatizações, Mensalão e Lava Jato contaram com próceres peemedebistas nos seus cantos obscuros. Michel Temer teve seus momentos de vilão sendo salvo das garras da justiça, temporariamente, em função do exercício do mandato presidencial e conivência da Câmara dos Deputados. A busca por fatias de notoriedade talvez lhe amenizassem o futuro e implacável julgamento da História.

Teria sido este o propósito com o qual o Presidente Temer decretou a extradição do ativista italiano Cesare Battisti, no crepúsculo do seu mandato, antecipando-se à promessa feita pelo então candidato Jair Bolsonaro. Porém, em vão veio a fama, pois o escolado fugitivo mais uma vez “deu no pé”, escafedeu-se. Como num jogo de roleta, passou a vez de Michel voltando a oportunidade para que o novo Presidente. Foram dias de silêncio a fim de que o predador abocanhasse a sua presa.

Enfim, nesta semana, foi desvendado o paradeiro de Battisti. Foi preso pelas autoridades da Bolívia, circulando solitariamente pelas ruas de Santa Cruz de la Sierra, cidade distante uns 600 Km da fronteira com o Brasil. Daqui fugiu para um País previsível, mas, sua esperteza ludibriou a nossa Polícia Federal, que, certamente, o entregaria como um valioso troféu ao Presidente Bolsonaro. Tanto é verdade que TV brasileira noticiou a decolagem de um avião dessa instituição policial desde Corumbá-MS em direção ao país andino na expectativa de recambiá-lo para cá. Provavelmente, para exibi-lo vexatoriamente para os brasileiros, principalmente para militantes fanatizados e um cala-boca na esquerda.

Em outros tempos e em outras circunstâncias vencedores tripudiaram sobre vencidos que lhes deram trabalho em combate. O Alferes Tiradentes teve sua cabeça e partes do seu corpo penduradas em postes em Ouro Preto-MG e suas cercanias. No começo da República, Antonio Conselheiro, morto em combate em Canudos-BA, foi decapitado para exibição pública. Na Ditadura Vargas, em 1938, Lampião, Maria Bonita e outros nove cangaceiros, depois de mortos em Alagoas, tiveram suas cabeças expostas na cidade de Piranhas e na Capital, Maceió.

Em tempos de aparente paz mundial e sob a proteção de direitos humanos, Battisti escapou desse destino. Mas, os raivosos, que ainda sonham com a barbárie, bem que o decapitariam se isso não fosse. Basta verificar o besteirol postado na internet, enquanto o procuravam. Exemplo maior dessa imbecilidade foi publicada no “site” boatos.org: um indivíduo postou “Brasil Paraíso dos Terroristas”, onde afirma que Cesare Batista (sim, Batista) aqui vivia e “recebia uma pensão de R$31.845,00 concedida pela Comissão da Verdade, enquanto isto um soldado de 1964 recebe R$2.876,00”. O “site” demonstrou que era “fake news”, consultando os beneficiários da Comissão da Anistia, ligada ao Ministério da Justiça, onde efetivamente afirma não constar tal nome da lista, pois, nunca foi a Comissão Nacional da Verdade responsável por pagamentos.

Outro detalhe que pude constar pelas imagens televisivas quando da chegada de Cesare Battisti à Roma foi a de que em hora alguma ele foi algemado, situação tão corriqueira aqui no Brasil, muito mais uma prepotência policial para desmoralizar as pessoas do que um real procedimento de segurança. Anteriormente, o Supremo Tribunal Federal, isto censurou e proibiu exceto para bandidos que ofereçam risco de resistência ou fuga. Também antes, o plenário do Supremo tinha decidido que a Constituição dava ao Presidente da República a prerrogativa de ofertar refúgio político a um cidadão, o que foi feito pela condição de estadista do Presidente Lula, concedendo refúgio a Battisti. Na década de 1980 ele viveu como refugiado no México, e no 2º mandato do presidente francês, François Miterrand, recebeu asilo político na França, vindo para o Brasil em 2004, quando Jacques Chirac veio a suceder o socialista.

Aconteceu que Battisti contava com a concessão de asilo político nesta fuga para a Bolívia. Surpreendentemente, o socialista-bolivariano Evo Morales negou este pedido, como que não querendo briga internacional ou para receber algum benefício da Itália ou outros países capitalistas. Daí que o fugitivo passou a ficar displicente e foi aprisionado pela Interpol Bolívia, que o entregou à Interpol Itália. Segundo o noticiário, ele confessou estar cansado destes 40 anos de fugitivo ou de refugiado político, ficando à mercê dos governos que mudam de mãos. De qualquer forma, na Itália, ele poderá obter algumas vantagens na sua pena de prisioneiro, inclusive, poderá comprovar que ele não foi responsável por todas as mortes de que é acusado, segundo ele diz. Battisti, num primeiro momento fugiu para a França, sendo julgado à revelia na Itália, com prováveis delações mentirosas – como tem acontecido no Brasil. Na época das tais mortes a Itália vivia um delicado momento, com lutas entre milícias da esquerda contra a direita e tropas do governo, este infiltrado pela máfia. Não houve assassinatos do modo que a grande imprensa e a direita brasileira tentam manipular, mas confrontos de grupos armados adversários e um governo italiano altamente corrupto. Estimam-se em 2.000 mortos nesses confrontos.

Assim caminha para o fim a saga de Cesare Battisti. Quem queria – e noticiou – que ele passaria pelo Brasil ficou murcho e com os sorrisos amarelos de quem apenas recebeu agradecimentos do governo italiano pela colaboração na caça. Quem esperava criticar o índio e presidente andino, Evo Morales, socialista-bolivariano, ficou estupefato que este tenha ficado discretamente com um troféu que seria retumbante para os novos governantes brasileiros.

*O autor é médico, foi prefeito de Muzambinho (1989/92; 2005/08) e deputado estadual-MG (1995/98; 1999/2003) -  marco.regis@hotmail.com