Publicado em 27/11/2019 - nilson-bortoloti - Da Redação
Há
cerca de trinta anos, veio se apresentar num show em Muzambinho o cantor
Paulinho Pedra Azul.
Nessa ocasião, contou uma piada sobre a nossa mineiridade, da qual nunca
me esqueci. É mais ou menos o seguinte: Dois homens, vizinhos, pequenos sitiantes, estavam
sentados, no final de seu expediente de trabalho, numa porteira que dividia as
propriedades. Ambos, sem se fitarem, contemplavam o horizonte, enrolando os
indefectíveis cigarros de palha. Eis que de repente, passa um elefante voando;
logo em seguida, passa outro elefante voando. Quando passa o terceiro, seguindo
na mesma direção, um dos sitiantes, ambos ainda com os olhos absortos no
horizonte, apontando o lado para aonde voavam os elefantes, comenta com o outro:
“Ué, cumpade, acho que o ninho deles é prá la.”
O que
se evidencia, aí, é o nosso jeito de ser. O mineiro não é de se derramar, de se
exacerbar. Acostumado a um padrão contemplativo, mercê do isolamento em que
vive no meio rural, ele raramente muda o seu humor. Contando com uma natureza exuberante
de um verdejar escandaloso que cobre as serras, ele frui sem pressa e sem
avidez daquilo que lhe proporciona a
santa mãe natureza
Me
quedo pensando: por conta de uma existência mais pródiga em bens materiais,
temos abandonado valores que fazem a vida realmente valer a pena. Todo o
benefício da tecnologia que teria o propósito de nos trazer tranquilidade e
conforto, muito ao contrário, tem servido para gerar uma neurose coletiva que
afasta do cotidiano aquilo que realmente vale a pena. Consumir ou se dopar, eis
a questão.
Por
que não optamos por uma vida mais simples, mais em contato com a natureza e com
o nosso semelhante? Será que precisamos
de tantas coisas para viver? O padrão de felicidade aspirado - carros chiques,
casa de alto padrão, viagens internacionais – são um terrível engodo. É uma
grande pena, que, muitas vezes, descobrimos isso tarde demais.
Ah! Alguns
dirão, mas o ser humano nunca esteve tão conectado! Será isso mesmo uma conexão
verdadeira, de âmago a âmago? Já tive facebook. Cancelei. Em princípio,
considerava que poderia ser uma excelente ferramenta de comunicação. Fui
percebendo que este avanço tecnológico tem servido, no mais das vezes, para
futilidades e para disseminar o ódio.
Quando
estava na Câmara, vereadores traziam à baila para a discussão alguns temas
sobre os quais eu estava absolutamente desinformado. Quis saber a origem daquelas
querelas improdutivas. Eram as redes sociais, que traziam comentários
desairosos e raivosos sobre um ou outro. Propus, em vão, que deixassem de se
imiscuir nesta baixaria. O ser humano parece ter uma propensão para a fofoca,
para a desvalorização do outro. Daí, as tão propaladas “fake News”.
As
pessoas não conseguem mais se internalizar. Pensar, meditar, contemplar, gozar
a companhia do outro. Nada disso parece fazer mais sentido. As pessoas fazem
caminhadas, falando feito tagarelas, outras fazem o exercício grudados no
celular o tempo todo, alguns caminham com um terço, rezando sem parar. Muitos
dirigem perigosamente pendurados nos seus telefones.
Parece que não conseguimos mais ficar a
sós conosco mesmo.
Há alguns que nos sufocam. Querem nos
impingir as suas histórias e não prestam a menor atenção naquilo que falamos
Tecem uma rede de lamúrias, como se o mundo conspirasse contra eles. Milor
Fernandes deu a definição perfeita para o chato.: “chato é aquele a quem a gente pergunta como vai e ele
explica”.
Seu José Martins, meu saudoso sogro,
sentava-se sozinho na minha varanda e lá ficava muito tempo, suspirando e
contemplando. Quando perguntávamos: “ Seu Zé, o que o senhor faz aí, tão
sozinho, tão calado?” E ele, na sua voz
abaianada: “estou assuntando”. É preciso que “assuntemos”, que não percamos o
bem mais precioso que temos, que é o tempo, com coisas que absolutamente não
nos elevam, nem nos acrescentam.
Falta-nos o estar junto, sem pressa e que
moldemos o nosso relacionamento naquilo que a comunicação tem de preciosa. Algo
assim: “Não quero te vender nada, não quero comprar nada, não quero te
convencer de nada. Só quero desfrutar da tua companhia. Não precisamos conversar
o tempo todo. Talvez eu saia daqui há pouco, sem explicações; da mesma forma,
tu tens a liberdade de saíres quando quiseres. Ninguém fez desfeita para
ninguém. Numa verdadeira amizade estas coisas não existem”.
Um
grande amigo dizia: “as pessoas aprendem no amor, ou na dor.” Embora cético,
espero sinceramente que aprendamos através do amor.