Publicado em 11/08/2020 - paulo-botelho - Da Redação
Aquele
encontro, marcado com antecedência, pareceu aos convocados como que um tanto
bizantino, especulativo, nebuloso. Os 28 convocados eram gerentes de agências
de um determinado banco. Todos eles estavam na faixa dos 50 anos de idade e com
mais de 25 de tempo de serviço. Esse encontro ocorreu na aprazível cidade
paulista de Serra Negra em um hotel fazenda. Teve início na noite de
sexta-feira e término na tarde de um sábado do mês de março de 2018. Cada
convocado passou a ser participante e a portar no peito um crachá com nome e
sobrenome.
O banco
contratou um famoso e esperto consultor de RH que, por sua vez, foi direto ao
ponto: "Aqui estamos para conhecer e participar de um processo de
recolocação por meio de outplacement: uma estratégia de planejamento de
carreira para o mercado de trabalho. Vocês deverão deixar o banco e suas
agências no prazo de 4 meses a partir de hoje". Dito isso, passam a tomar
conhecimento do "ganha-ganha" previsto no outplacement. Na verdade,
uma solução para demissão inventada pelos americanos e que "pegou"
bem aqui no Brasil.
"O
como se portar nas entrevistas de seleção" consumiu a noite de sexta-feira
e quase todo o sábado.
Já no
Café da Manhã, Paulo César, representante da diretoria do banco, procura ser
amável e interativo, porém sem sucesso. Senta-se na cabeceira da mesa do Café,
tendo ao seu lado o gerente Armando Fragoso Neto. Assim que leu o nome do
Armando no crachá, pede, com um sorriso nos lábios: "Armando, por
gentileza, me passa o pão e o requeijão".
Baixo,
magro e enrugado, Paulo César cultivava uma barba densa e grisalha; no rosto,
além da barba, só os olhos revelavam. a um bom observador, como eram
fugidios,sinistros.
Armando
ficou órfão de pai e mãe com apenas 8 anos de idade. Criado pelos avós, inicia
aos 14 anos sua vida profissional indo trabalhar como Office-Boy no banco. E
passa a seguir o exemplo do avô: disciplinado e honesto. "Não posso nunca
decepcionar o meu avô, pois levo o nome dele". Dizia com frequência.
Em 2014,
ocorre um assalto na agência do banco. Armando foi o único funcionário a não se
deitar no chão, mesmo sob a mira das armas dos assaltantes.
Bem tarde
da noite daquele sábado, ao voltar para casa, Armando encontra a mulher um
tanto nervosa, a perguntar: "E daí, meu bem, como foi o encontro?" -
"Tudo bem, minha flor, eu não vou ser demitido do banco". -
"Mas, como você pode ter certeza?" - "Ora, o Paulo César,
representante da diretoria do banco, me conhece bem. - Hoje mesmo, no Café da
Manhã, ele me pediu para lhe passar o pão e o requeijão. E ainda me chamou pelo
nome!"
Paulo
Augusto de Podestá Botelho é Consultor de Empresas e Escritor.
E-mail: papbotelho5@gmail.com