Publicado em 18/03/2019 - cesar-vanucci - Da Redação
“Simplesmente inventaram o que seriam “candidatos laranjas”, cuja única função aparente era receber verbas e transferi-las.” (Editorial do “Diário do Comércio”, dois de março)
A
corrupção, sempre com as mandíbulas expostas à desmesura, é mais antiga do que
a Serra da Canastra. “Rome omnia venalia esse” (“Em Roma tudo está à venda”),
já denunciava Salústio, bocado de anos antes do advento do Cristianismo. O
registro pertence ao esplêndido “Dicionário de Citações” organizado no supremo capricho
por Paulo Rónai. Outras frases, também inseridas na mencionada publicação,
atestam a perversa longevidade da abominável prática. Aqui estão: “A corrupção
do melhor é a pior das corrupções” (“Corruptio optimi pessima”). Autor?
S.Gregório, O Grande, que viveu entre 504 e 604. William Shakespeare
(1564-1616) bate forte, como de costume: “Ah, se as propriedades, títulos e
cargos/Não fossem fruto da corrupção! E se as altas honrarias/Se adquirissem só
pelo mérito de quem as detêm!/Quantos, então, não estariam hoje melhor do que
estão?/Quantos, que comandam, não estariam entre os comandados?” Isso aí...
A
corrupção, já foi dito também noutra ocasião, é que nem grama tiririca. Extraio
de um poema composto no saboroso dialeto roceiro sugestiva descrição dessa
planta daninha. Ilustra bem a comparação arguida. Vamos lá: a tiririca “a gente
pode arrancá,
virá de raiz pro ar, mais qua! Um fiapo escondido
no torrão faiz a peste vicejá...” A citação do verso cobra
deste desajeitado escriba uma explicação. Por bom pedaço de tempo andei admitindo
que os dizeres sobre a matreira gramínea fossem da lavra do notável Catulo da
Paixão Cearense, Primeiro Violão inconteste da Sinfônica Poética Brasileira.
Dei-me conta do equívoco, certo dia, ao ouvir o Rolando Boldrin declamar o
poema por inteiro em seu magnífico programa na televisão. Contudo, lastimavelmente,
não houve como reter na memória velha de guerra o nome do verdadeiro talentoso autor.
Os
corruptores e corruptos de carteirinha de todos os tempos não esmorecem em seus
nefandos propósitos. Imaginação fertilíssima, valem-se de todos os estratagemas
já inventados para burlar a boa fé coletiva. No andamento da operação “Lava Jato”
tivemos amostras disso. Quando começaram a vir a lume as primeiras informações
acerca dos malfeitos cometidos, a impressão que se tinha era de que os atos
ilícitos estavam circunscritos à esfera petista. Com o andar da carruagem
comprovou-se que não era bem assim. O “propinoduto” atendeu a gregos e
troianos. Despejou “agrados” em todas as bandas. Por mais inverossímil que pareça,
oposicionistas extremados, entre os tucanos, emedebistas e outros, que se
gabavam em tom triunfal de sua conduta ilibada em meio à pororoca de denúncias,
se viram, também, de hora para outra, clamorosamente pilhados com a “boca na
botija”. A opinião pública, estarrecida, deu-se conta, então, das reais
proporções do asfixiante problema. Empreiteiros desonestos, agentes públicos
infiéis, políticos inidôneos, das mais diferentes tendências, achavam-se
enredados num colossal esquema de desvio de recursos públicos.
A
vigorosa expectativa e mesmo a ardente esperança da sociedade brasileira,
focadas em mudanças fundamentais que consigam opor barreiras a desvios de
conduta geradores de fraudes no manuseio dos dinheiros públicos, expressamente evidenciadas
na campanha sucessória, já se vêem molestadas por ardilosas manobras indicativas
do reflorescimento da “tiririca”. O nosso DC, no editorial estampado na edição
de 2 de março, pontua magistralmente, ao se reportar à “invenção” dos
“candidatos laranja”, que “mais uma vez, para desilusão talvez dos mais
crédulos, a diferença entre o desejável e o acontecido foi grande e não foi
preciso muito tempo para que se percebesse como partidos políticos e candidatos
– nem todos é de se supor – se adaptaram aos novos tempos e com assustadora
agilidade”.
Há
mais coisas inconvenientes relacionadas com o vasto “laranjal”. A bancada parlamentar
convocada a apoiar projetos governamentais, tal qual acontecia no passado, impôs
condições - ao que parece já devidamente acertadas – para que tudo se enquadre
no enredo costumeiro. Ou seja, para que tudo permaneça “como dantes no quartel
de Abrantes”. O propalado “banco de talentos” não passa de rótulo novo para a antiga
distribuição de cargos a cupinchas na administração pública. A liberação de
“bônus” nada mais é do que a tradicional e generosa oferenda de verbas para
ações de interesse estrito dos representantes parlamentares. Encurtando razões:
mais do mesmo.
Um
fiapo escondido no torrão faz mesmo a peste vicejar...
Cesar Vanucci - Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)