A COPA DO MUNDO E IDEOLOGIAS POLÍTICAS

Publicado em 11/06/2010 - marco-regis-de-almeida-lima - Marco Regis de Almeida Lima

A grande massa torcedora do mundo futebolístico mundial estará literalmente antenada, a partir deste final de semana, durante um mês, nas porfias que acontecerão nos estádios sulafricanos. A África do Sul é uma grande mistura de etnias e dialetos, que estariam representados na própria jabulani, a bola oficial da copa, produzida pela multinacional Adidas, uma combinação de onze cores diferentes. Pela primeira vez o campeonato mundial de futebol, em sua 19ª. edição, acontece no continente negro. Dois simbolismos políticos estupendos aqui se estampam e a juventude de hoje não pode deixá-los passar em brancas nuvens.
O principal deles continua sendo muito enfocado – o “apartheid” – uma palavra sulafricana significando a segregação de uma imensa maioria negra por uma minoria branca, por cujo fim lutou e sobressaiu a figura histórica de Nelson Mandela. À custa de 27 anos de prisão, ele tornou-se o primeiro presidente constitucional do país, após a derrocada do odioso regime racista e recebeu o Prêmio Nobel da Paz em l993, o que, também, consagrara o bispo Desmond Tutu, em l984, também baluarte contra a violência racial naquele país.
O outro, deu-se pela eleição de um brasileiro de origem belga, Jean-Marie Faustin Godefroid Avelange, dito João Havelange, para a presidência da FIFA – Federação Internacional de Futebol Associação – que fora por muitos anos o presidente de nossa confederação nacional, herdada em seguida pelo seu genro Ricardo Teixeira, que lá está até hoje. Na sua obstinação para dirigir a entidade máxima do futebol mundial, coisa inédita para um não-europeu, Havelange prometeu e conquistou os votos das confederações africanas e asiáticas, transformando a FIFA numa espécie de potência mundial com mais de 200 países e um orçamento de alguns milhões de dólares, além de aumentar o número de participantes das copas mundiais de 16 para 24 e, depois, para 32. João Havelange expulsou a África do Sul da FIFA por causa do “apartheid”, reintegrando-a após a sua extinção. Por tudo isso, esse notável desportista brasileiro foi considerado pelo Comitê Olímpico Internacional – COI – como um dos três maiores dirigentes esportivos do século passado, ao lado do Barão de Coubertain, que instituiu os jogos olímpicos modernos e o espanhol Saramanch que por muitos anos presidiu o COI.
Mas, por aqui, a imprensa tupiniquim muito malhava “monsieur Avelange”, ainda hoje um dos donos da Viação Cometa que, orgulhosamente, adentra Muzambinho, através da linha de ônibus Ribeirão Preto-Juiz de Fora-Ribeirão Preto.
Enfim, o continente africano, considerado o berço da vida humana, tem a sua primeira copa do mundo de futebol pelos sonhos e pela luta política de Mandela e Havelange, cada um no seu plano de atuação.
Uma semana antes do começo da Copa da África do Sul, o incomparável Diego Maradona, que brilhou como jogador da Argentina, na Copa do México de 1986, quando a sua pátria foi campeã mundial pela segunda vez, hoje no comando técnico da seleção portenha, deu uma belíssima entrevista ao programa Esporte Espetacular da Rede Globo de TV. Mais uma vez ele demonstrou um engajamento político que, lamentavelmente, sempre faltou no Rei Pelé. Perguntado como os seus jogadores lidariam com a pressão da imprensa e da torcida do seu país, ele foi magistral na resposta: “ que pressão ? não existe pressão num elenco que fatura milhões de euros no futebol europeu...pressão é o que suporta um trabalhador que madruga pra  ganhar aquilo que vai comer de noite”.
Agora, gostaria de abordar uma visão preconceituosa da política aplicada no esporte, ou uma maneira de manipular a opinião pública contra um país, como se vê, sistematicamente, no trato de assuntos relativos à participação da Coréia do Norte. O problema é que os reacionários meios de comunicação que cobrem o acontecimento maior do futebol planetário não engolem que ainda sobrevivam governos comunistas por aí afora. Noticiaram a queda do Muro de Berlim como se fosse o fim de todos os governos comunistas e se deram mal. Esqueceram que o país mais populoso do planeta, a China, querendo ou não é comunista. Como Cuba, como o Vietnam, como a Coréia do Norte, como o Laos. São fortalezas ideológicas que resistem às facilidades do capitalismo consumista e ponto final. Se a vida na Coréia do Norte fosse tão ruim, como apregoam, o seu elenco não contaria com o “Wayne Rooney da Ásia” seu principal jogador, Jong Tae-se, um japonês de Nagoya, naturalizado cidadão nortecoreano por questões de crença pessoal, embora atue no Kawasaki Frontale, do Japão e pudesse estar nessa seleção.   
Outro participante da atual Copa que, desta vez, vai passar despercebido é a Sérvia. Entretanto, décadas atrás era tão malhada quanto a Coréia do Norte. Isto porque, antes, era a temível Iugoslávia, do comunista Marechal Tito ou de um de seus sucessores, Slobodan Milosevic, que morreu preso no espúrio, ilegítimo e faccioso Tribunal Penal de Haia, a serviço dos Estados Unidos e seus amigos, pois, se assim não fosse, o mesmo teria que ter prendido e julgado um facínora como George W. Bush, este apenas um exemplo.
Por estas e outras razões eu vejo sempre o esporte pelo viés político que me agrada e não por aquele que os outros manipulam como se tivessem inocentemente falando de esportes. Por isso, nesta Copa, tirando o meu coração verde-amarelo, agora rajado de vermelho pelo corajoso e decidido governo de Lula, vou torcer, em segunda opção, pela Coréia do Norte, pela Argentina, pelo Uruguai, pelo Paraguai, pelos times da África negra, pela Argélia e até pela Sérvia. Não mais pela Eslováquia, pelo Chile nem pelo México. Nunca para Inglaterra, Estados Unidos, França, Alemanha e Espanha. Para Portugal, quem sabe, pois bate saudade de mãe.