A DETROIT DOS MEUS SONHOS

Publicado em 09/03/2015 - marco-regis-de-almeida-lima - Da Redação

A DETROIT DOS MEUS SONHOS

                         Tudo o que você possa vir a escrever, hoje, estará sujeito a críticas, mormente se não tiver a chancelá-lo um título de pós-graduação, do mais simples ao doutorado. Antigamente, você expunha suas ideias e os seus conhecimentos, procurando aclará-los com um razoável  vocabulário e uma correta gramática. Hoje, não. Há conceitos e teorias para todos os assuntos imagináveis.  Antes, um verdadeiro cientista era aquele sujeito que passava dias e noites fazendo solitários experimentos com substâncias químicas, pequenos animais, partículas atômicas, campos elétricos ou magnéticos, robôs, chips, telescópios,  microscópios e outros. Hoje, não. Basta desenvolver teses abstratas e subjetivas, em certas áreas da vida humana ou planetária, irrigá-las com opiniões e números que inundam a internet, ter um curso superior, que o sujeito vira cientista social, cientista político, cientista econômico e outros mais.

                         Confesso que o meu contorcionismo de expressão é um desabafo,  talvez pela pouca autoridade que os meus textos possam representar para muitos que se dão ao trabalho de os ler. Entretanto, alguma coisa do que falei ou escrevi, durante  a minha vida, por diversas vezes pressenti que funcionou como uma seta desbravadora.

                         Neste sentido, quero exemplificar, referindo-me a um artigo que escrevi,  aqui mesmo n’A Folha Regional, nos idos de 1993, quando eu já pugnava, denodadamente, pelo CONTROLE DA NATALIDADE, dando como testemunho as minhas ações isoladas e gratuitas como obstetra, procedendo esterilizações de mulheres no pós-parto, quer normais  ou nas cesarianas de estritas indicações obstétricas, desde os meus primeiros anos de profissão. Isto eu o fazia na convicção de um ato de proteção planetária, mas, sempre respeitando a iniciativa e a vontade das mulheres, únicas donas dos seus corpos, nunca dos maridos nem do Estado.

                        Veio, então, a oportunidade da ampliação dessas ações quando fui guindado à condição de prefeito municipal. Tornou-se uma política pública, desburocratizada,  mas com critérios bem definidos, estendida a todos os médicos, gestantes  e demais mulheres que nisso tudo se enquadrassem. Também foi aberta a opção da vasectomia para os homens e foram dezenas os beneficiados. Um detalhe curioso e disciplinador eu impus para os colegas de profissão: todos os procedimentos seriam rigorosamente pagos pelo Município exceto nos casos de cesarianas iterativas, da terceira em diante, quando o ato de esterilização cirúrgica teria que ser executado compulsoriamente, de graça para os cofres públicos, um modo de conscientizar e responsabilizar o médico diante de uma quase imperativa indicação. Com a minha ascensão ao cargo de deputado estadual, pude ampliar essas ações para muitos outros municípios mineiros, claro que ás custas do meu salário.

                           Tudo o que até agora expus tem a ver com o referido artigo publicado em 1993. No mesmo, eu me intitulava um ULTRAMALTHUSIANO, onde as minhas assertivas sobre  o controle populacional se davam  em função da minha preocupação com a finitude dos recursos naturais do planeta Terra. Nunca em função da pobreza e das mazelas sociais da população. Pois bem, naquela época,  muito me embeveceu um comentário positivo feito por um leitor e amigo, que,  ao longo dos anos, por algumas vezes, voltou a comentá-lo comigo. Na época, Otonelson Eduardo Prado era professor, formado em filosofia  pura, e fabricante de produtos para chás naturais,  a partir de plantas medicinais que cultivava. Atualmente, é advogado e ambientalista, podendo ser acessado em:  otonelsonadv.blogspot.com.br, além de apresentar programa ecológico na Rádio do Povo AM, de Muzambinho.  Ao recordar-me desse antigo escrito, voltei ao assunto, tendo a internet ao meu dispor, condição para mim inatingível 20 anos atrás, quando eu nem dispunha de computador.

                         Dessa maneira, fui ao reencontro de Malthus e teorias paralelas, bem como atualizar-me a respeito da anunciada falência de Detroit, A Capital do Automóvel nos Estados Unidos,  decretada em 2013,  a 5ª maior cidade americana em1950, quando atingiu a marca de 1.800.000 habitantes, chegando a possuir a maior renda ‘per capita’ daquele país. Pois essa cidade sofreu um colapso urbano, regredindo para 713.000 habitantes em 2010, com veloz crescimento da pobreza e aumento da criminalidade, caindo para a 18ª posição no ‘ranking’ populacional das cidades americanas, com milhares de casas e prédios abandonados, em decorrência da perda de espaço para a indústria automobilística japonesa, durante o processo de globalização.

                      A teoria de Malthus (1766-1834) foi superada desde quando o homem demonstrou ter capacidade de produzir alimentos, com o auxílio da tecnologia, para abastecer a humanidade em crescimento geométrico. Do Malthusianismo derivou o Neomalthusianismo, surgido nas primeiras décadas a partir de 1900, mas que se fortaleceu depois da 2ª Guerra Mundial, pois o fim do conflito e o avanço da medicina fizeram baixar a taxa de mortalidade, mantendo-se alta a taxa de natalidade, ocorrendo uma verdadeira explosão demográfica mundial. Para mascarar uma inequívoca exploração dos países ricos – compradores de matérias primas baratas – sobre os países pobres – produtores das matérias primas e compradores de produtos dela industrializados, mais caros – adveio o neomalthusianismo, que dizia, em resumo: os países do Terceiro Mundo são pobres, pois sua população é enorme, impondo-lhes a culpa pela sua pobreza.

                          Contrapondo-se a ambas as teorias,  que acabam de ser descritas, surge a Teoria Reformista que refuta seja a superpopulação causa de pobreza. Para seus defensores, se não houvesse pobreza, o povo teria acesso à educação e à saúde, regulando, naturalmente, o crescimento populacional, através do conhecimento, como fizeram os países escandinavos e europeus.

                        Já o ECOMALTHUSIANISMO teria surgido entre as décadas de 1970 e 1980, aparecendo reformulada pela problemática ambiental, referindo-se a possibilidade não tão distante da escassez de recursos minerais devido ao superpovoamento da Terra, envolvendo também  controle da natalidade x pobreza.  Percebo agora, que, concomitantemente a esta teoria,  eu me intitulava um ULTRAMALTHUSIANO e praticava minhas ações pela diminuição da população, mesmo que fosse a pedido das pessoas.

                          Naqueles tempos,  se eu dispusesse da fartura das faculdades de hoje, se eu recorresse a um orientador delineando as minhas idéias, que me ensinasse a manusear os ainda pouco conhecidos computadores, ou mesmo pesquisasse nas grandes bibliotecas,  como eram feitos os trabalhos de dissertação, talvez o ULTRAMALTHUSIANISMO pudesse ser mais uma teoria de controle populacional da raça humana e pudesse ser localizado na internet de hoje onde pesquisei, ou seja, CONCEITOSETEMAS.BLOGSPOT.COM.BR/2008/03/ ECOMALTHUSIANISMO-E-OUTRAS-TEORIAS.html.  Mas, como nas minhas visões, não entraria o envolvimento financeiro, talvez fosse descartada e eu até processado como um plagiador dos ecomalthusianos.

                       Como nos filmes de guerra nuclear, ou de ataques de alienígenas, sempre sonhei em ver grandes metrópoles esvaziadas, com a redução da população mundial. A Detroit decadente,  quem sabe,  é uma amostra do que está por vir e que só era vista no cinema. Mas,  que ainda vi antes de morrer. Neste caso, com toda a pena que senti dos seus moradores fugitivos, pois a Detroit dos meus sonhos, esvaziada, não iria se dar por catástrofes nem por crises de dinheiro, pura e simplesmente por um paciencioso e demorado processo de reducionismo humano.

*marco.regis@hormail.com – O autor é médico,tendo sido prefeito de Muzambinho (1989/92; 2005/08) e deputado estadual-MG (1995/98; 1999/2003).