Publicado em 13/04/2018 - marco-regis-de-almeida-lima - Da Redação
Não me condenem por insubordinação à
justiça. Na verdade a primeira qualificação do título deste artigo transbordou
da indignação de um dos onze membros do STF – Supremo Tribunal Federal –
Ministro Gilmar Mendes, na reunião do Pleno dessa Suprema Corte, nesta 4ª.feira,11,
quando da apreciação de um pedido de “habeas corpus” (HC) para um notório preso
da Lava Jato, Antonio Palocci, ex-Ministro do Governo Lula, encarcerado cautelarmente
há mais de um ano e meio na “República de Curitiba”. Ou para ficar melhor
entendido, em “prisão provisória”. Fazendo coro, emendou outro erudito
Ministro, e o segundo mais antigo daquele Tribunal, o carioca Marco Aurélio de
Mello, empossado no STF em 1990, afirmando que tais prisões provisórias têm se
tornado “abusivamente quase que definitivas”.
O Ministro Gilmar Mendes,
matogrossense de Diamantino-MT, bacharel em Direito pela Universidade Nacional
de Brasília, foi nomeado membro da nossa Suprema Corte em 2002, por indicação
do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Embora tenha afinidade com a política
dos tucanos, ele tem tido posturas firmes e contundentes na defesa da
Constituição Federal (CF), por isso mesmo vem sendo hostilizado por adeptos e
cultores da “divindade” do juiz Sérgio Moro como se fora um petista, posição
que nunca teve, aliás sempre foi um crítico do lulismo e do petismo. Possui ele
um invejável currículo, fala fluentemente o alemão, sendo que na Alemanha fez
pós-graduação, mestrado e doutorado.
Pois bem, na aludida reunião plenária
do STF desta semana, Gilmar Mendes manteve-se unido à ala defensora da concessão
do HC diante da análise de cada caso, sendo avesso à intransigência dos que
tentam flexibilizar o Artigo 5º, inciso LVII, da CF, que diz textualmente:
“ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal
condenatória;” ou, relativamente, à jurisprudência firmada por uma maioria –
numericamente não-representativa (6 contra 5) – que decidiu pela prisão dos
condenados em 2ª Instância, ou seja, condenados por um Juiz singular de 1ª
Instância e a sentença confirmada por um
tribunal colegiado de 2ª Instância. Esta ala de cinco representativos ministros
considera e valoriza o “habeas corpus” (HC) como um remédio heroico na defesa
das garantias e liberdades individuais, bem como a prisão após o trânsito em
julgado – quando se esgotarem todas as possibilidades recursais de defesa –
porque entendem também que o Inciso LXI do mesmo Art. 5º é o regente da prisão:
“ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e
fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de
transgressão militar, ou crime propriamente militar, definidos em lei;”. Semana
passada, esse grupo de coesa consciência se posicionou favoravelmente ao HC de
Lula, bem como, agora, a favor do conhecimento do HC de Palocci, havendo empate
com as posições dos contrários – 5x5 – vindo sempre a desempatar a
Ministra-Presidente, a mineira de Montes Claros, Carmem Lúcia Antunes Rocha,
que desempatou contra Lula, semana passado, e contra Palocci, nesta semana.
Porém, lá atrás ela votou contra a cassação de Aécio Neves, sugerindo para o
senador um esdrúxulo “recolhimento domiciliar noturno”.
Quando do julgamento do HC de
Lula, condenado em 1ª e 2ª Instâncias, a posição de certos ministros poderia
até parecer coerente com a decisão colegiada do STF de deixar prendê-lo, pois
houvera a 2ª Instância. Mas, e agora o Palocci, que está preso “provisoriamente”
em Curitiba, provisoriamente há 1 ano, 6 meses e 15 dias – somente condenado em
1ª Instância por Moro. Por essa e por
outras é que o Ministro Gilmar Mendes não se conteve e fez vários desabafos em
altos brados: “melhor seria nós declararmos inconstitucional o instituto do ‘habeas
corpus’ [...] “Juízes tremem de medo de enfrentar o ‘Jornal Nacional’ ou a
‘Folha de S.Paulo’” [...] “estamos submetidos à Constituição de Curitiba” [...]
“os juízes Moro e Bretas encontraram meios de afrontar o Supremo, quando este
concede um HC, eles condenam o indivíduo em outro processo e o prendem de novo”
[...] “quero revelar que o advogado Batochio, antes de ser defensor de Lula, me
confidenciou que deixaria certo caso, pois Sérgio Moro interferia na escolha de
advogados que negociassem delações” [...] “estamos dando empoderamento a essa
gente” [...] “acho que Moro pensa que fala com Deus”.
No julgamento do HC de Lula, o
Ministro Marco Aurélio se posicionara na mesma linha: “Longe de mim o populismo
judicial, longe de mim a hipocrisia”. Fez duras críticas à automaticidade da
prisão após condenação em 2ª Instância, para agradar certos setores da
sociedade dizendo-se contrário à “sanha punitivista” [...] “meu dever maior não
é votar para agradar uma maioria indignada” [...] a presunção da inocência não
é uma ‘jabuticaba’ brasileira, nenhuma criação brasileira”, e citou várias
constituições de países civilizados e convenções internacionais que a
consagram.
O mais antigo dos ministros do STF,
o paulista de Tatuí, José Celso de Mello Filho, membro do STF desde 1989, da
estirpe de juízes que deixam seu talento e atuação na história da nossa mais
alta Corte de Justiça, votou pela concessão do HC tanto de Lula como de Palocci
registrando, na semana passada: ”os caminhos do iluminismo foram iluminados
pela regra da presunção da inocência” [...) não pode o Supremo submeter-se às
pressões populares e ao clamor público sob pena de subversão do Regime
Constitucional e a falência do Estado Democrático de Direito”.
Veja que não somente Gilmar Mendes
falou em covardia dos seus colegas do Supremo. Marco Aurélio chegou a apontar
para a Ministra-Presidente para culpá-la de estar manipulando a pauta das
reuniões, dizendo: “venceu a estratégia”.
Se órgãos colegiados de justiça
deliberam por pressão da imprensa empresarial e manipuladora da opinião pública
EU acrescento à COVARDIA, explicitada por Gilmar e seus pares, a PARTIDARIZAÇÃO
POLÍTICA, porquanto o acovardamento diante da imprensa manipuladora, bem como
de famigerados movimentos fascitóides como o “Vem prá Rua”/ “Radicais on Line”/
“MBL – Movimento Brasil Livre” têm como sinônimos: coloração política. Na minha
experiência de ex-parlamentar mineiro, via que grupelhos não mudam de posição
diante de discursos, de leis nem de claras evidências. Nossos tribunais
superiores estão se comportando da mesma maneira. Diante de tantos golpes e trapaças, já é hora
de se pensar em expurgar da nossa Constituição a inamovibilidade e a
vitaliciedade de juízes, enquadrando-os em mandatos populares, pois aí
saberemos que não são políticos disfarçados de santos.
Marco Regis- O
autor é médico, foi prefeito de Muzambinho (1989/92; 2005/08) e deputado
estadual-MG (1995/98; 1999/2003) – marco.regis@hotmail.com