De onde vem?

Publicado em 03/02/2016 - paulo-botelho - Da Redação

De onde vem?

Rosto castigado pelo sol e por noites insones, nunca mais vi aquele homem tão pequeno e frágil, mas determinado. Mal nascia o sol, eu já acordava ao ouvir o trotar de seu cavalo puxando uma carroça pela subida da rua de minha casa todos os dias da semana, exceto aos domingos. Ia em direção à Cooperativa para vender o leite recém-saído das tetas de duas vacas que tratava com todo carinho. Na boléia da carroça ele e a mulher seguiam espremidos no pequeno espaço. Na parte de trás dois latões do leite obtido ainda na madrugada do dia. Sempre que nos encontrávamos pelas ruas daquela cidade ele tirava o chapéu para me cumprimentar, dizendo: "Eu não tiro o chapéu para qualquer um!" O que mais me chamava a atenção era como ele conduzia o cavalo atrelado à carroça: só com a rédea, sem chicote ou domador, sem nada; apenas "conversando" com o animal. Eu não sei descrever  com precisão a dura tarefa de um leiteiro como a daquele homem que nunca mais vi.

Certa vez, faz tempo, uma de minhas filhas, ainda pequena, me perguntou: "O leite vem da geladeira, não é, papai?" – Respondi que sim, exceto para aqueles que o produzem. Também, não sei (ultimamente não sei de quase nada) descrever o trabalhão que dá para fazer o leite chegar à geladeira. Mas, para produzir um par de sapatos são necessários o couro, o solado, o cadarço e outros materiais. O couro, retirado do frigorífico, vem da criação do gado que precisa de pasto e de nutrientes como água, gás carbônico e energia solar, entre tantas outras coisas.

Mas, de onde vêm os lucros dos bancos que estão por detrás de atividades tão difíceis como essas? Nem o Espírito Santo, se baixasse, saberia explicar a voracidade deles. Semana passada, o presidente do Bradesco, que atende pelo nome de Trabuco informou que o lucro líquido desse banco em 2015 foi de R$ 17,19 bilhões!

Nunca mais vi aquele homem tão pequeno, frágil e determinado. Mas, sei que ele tem lá com os seus botões uma dura e inexorável constatação : Se a natureza fosse um banco, já estaria sã e salva!

Paulo Augusto de Podestá Botelho é Consultor de Empresas e Escritor. www.paulobotelho.com.br