Sobre Indigência Mental

Publicado em 14/03/2016 - paulo-botelho - Da Redação

Sobre Indigência Mental

Somente a volta à racionalidade e ao correto espírito das leis podem por fim ao espetáculo policial-midiático dos noticiários.

"Fizemos de tudo para não despertar atenção em prol da segurança do Senhor Lula". – Que gesto gentil e cavalheiresco do juiz Moro! – Vale lembrar aqui a constatação de Shakespeare em O Rei Lear: "The prince of darkness is a gentleman" (O príncipe das trevas se assemelha a um cavalheiro).

Lula não é um misantropo para ser levado "debaixo de vara". Não há culpa formada com provas concretas contra ele, portanto, não pode ser tratado como delinquente.

Tenho mais de sessenta anos. Minha geração lutou – e muito – para tirar este país das patas da Ditadura Militar (1964-1985). Nessa época o juiz Moro ainda brincava de caçar passarinhos nos parques de Curitiba.

Juízes e promotores, de um modo geral – salvo raríssimas exceções – não leram "O Espírito das Leis" de Montesquieu; não leram "Dos Delitos e das Penas" de Beccaria; não leram "Os Donos do Poder" do jurista Raymundo Faoro e sequer tiveram contato com "Raízes do Brasil" de Sérgio Buarque de Hollanda. – Acho que é por isso mesmo que são tão primários, tão toscos. Mas, em compensação, acho que leram Carl Schmitt, o jurista do Nazismo que tanto inspirou os militares golpistas de 1964.

Mal amanhece o dia, e o "japonês bonzinho" e sua tropa de choque da Polícia Federal toca a campainha ou arromba a porta de uma residência. Paradoxo infame: esse japonesinho de óculos escuros, que atende pelo nome de Newton Ishii, foi preso pela própria Polícia Federal em 2003 por envolvimento de contrabando em Foz do Iguaçu.

Temos uma justiça que remunera de forma régia os seus representantes. Um juiz de Primeira Instância ganha, em média, R$ 22.000,00 por mês, mais auxílio moradia, mais gratificações e mais – pasme o leitor – 60 (sessenta) dias de férias por ano.

Sou bisneto do Juiz de Direito e Escritor Doutor Joaquim de Luna Miranda Couto. Juiz de Direito de Primeira Instância no início do Século XX, Doutor Luna ganhava algo em torno de 1/6 (um sexto) do que ganha um juiz nos dias de hoje. Não tinha auxílio moradia; não tinha gratificações; não tinha férias. Mas, tinha, isso sim, que lecionar e escrever para poder sustentar sua família. Minha avó, dona Maria de Luna Botelho me contou que, uma única vez na vida, a sua mãe dona Anatólia foi com o Doutor Luna para uma "Estação de Águas" em Poços de Caldas. Ela guardou as cartas que seu pai trocou com o Doutor Heráclito Fontoura Sobral Pinto. Numa das cartas que li, o Doutor Sobral diz ao Doutor Luna: "Nós sabemos, Luna, que as testemunhas  são as meretrizes das provas". - Nada mais verdadeiro e atual.

Sobre o nível mental desses administradores de justiça acho que tanto Luna quanto Sobral estariam perplexos com tanta indigência.

Não há pena sem lei; também significa não haver pena sem prova de culpa. – Eis aí a questão.

Paulo Augusto de Podestá Botelho é Consultor de Empresas e Escritor. www.paulobotelho.com.br